quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Uma grande história
Uma grande história não tem jeito !
ela amarra as entranhas em nossos dias e arrasta tudo ao seu redor
é a forasteira de nossos medos e segura firme no manche
as tempestades viram chuviscos, os maremotos deixam
apenas pocinhas de nada, a história perdura.
Uma grande história demora para ser escrita
brinca de ser rabisco, permite borrachas e finge que "desesxiste"
palpita sonolenta nas madrugadas, novos fatos como atas
dorme frases, cochila textos inteiros mas sobrevive
Uma grande história dança pacientemente nas luas
brinca com a chuva e se aquece com o sol, permite os anos
até parece que só por teimosia se mantem até acontecer
Ela sabe de sua infinitude, tem a calma dos monges
e a paixão das almas vermelhas, deglute seu vinho
com o sorriso dos grandes sábios.
Uma grande história me acordou de sobressalto há muito
tempo atrás, tanto tempo que nem sei...
ja dormiu, comeu, engasgou, chorou, fingiu que morreu
mas hoje a vejo dormindo...
Enrolada qual gato em almofada, cara de sonsa
ri para mim a calma das manhãs,
e espera...sim. Isso tudo porque
Uma grande história espera.
Márcia Poesia de Sá.
Tempo dos poetas

É no tempo dos poetas
que os arabescos se formam
desenlaçam-se e se enroscam
num balé para além da imaginação
É no tempo dos poetas
que as nuvens fazem amor entre si
fluidamente desfazem-se e refazem-se
noutras formas, noutras matizes
É no tempo dos poetas
que o mar afasta-se lento
dando espaço a areia que caminha
observa terno as gaivotas
beija as andorinhas...
É no tempo dos poetas
que a pele pede clemência
que o arrepio evapora sem decência
e os sons ecoam sem ar...
É no tempo dos poetas
que as pegadas viram flechas
que o olhar umedece-se por completo
e fecha os cílios dos olhos
do corpo que abandona-se em brasa
É no tempo dos poetas
que as linhas são feitas em suspiros longos
onde as manhãs parecem não chegar
e onde a lua fica rubra
por nem conseguir olhar!
Por fim, é só no tempo dos poetas
que eternizam-se momentos
em círculos que crescem
como ondas de uma única gota
no plácido lago da febre.
E é apenas lá, no tempo dos poetas
que os pelos seguem suas marés
perdendo-se entre o levantar e deitar
num ritual sem horário nem tempo.
É no tempo dos Poetas...
é no tempo dos poetas...
Márcia Poesia de Sá.
... E o desejo dedilha a canção dos uivos
no velho piano recostado na parede bege,
...e a cortina transparente dança valsa com o vento
enquanto aos poucos, incendeiam-se os lençóis
de todos os tempos, num mormaço que toma conta do resto...
É na lânguida palavra calada,cadente entre dentes
que a fera morde seus instintos!
e esbraveja roucos rosnados
por entre asas docemente invisíveis.
Tão efêmera é a viagem.
Transcendental os instantes
entrega abrupta dos veios da razão...
e no pulmão dorme, a falta de ar.
E as gotas abraçam-se devagar...
Calor. ( trecho)
Márcia Poesia de Sá.
Tragar um traço


Traço o verso
capenga
inútil, 
travestido,
irônico
trago o verso quente,
fumaça al dente
calafrios...
traço o verso despudorado,
arredio, alucinado, vadio
trago o verso endiabrado,
famigeradamente tardio...
traço o risco
que traga
as traças do dia
ponteado de melancolia
saudade do espaço
entre os traços e pernas
que nas veias corria
Traço o verso
no inverso
da nua sinfonia
Com notas dissonantes
de ardor e poesia
Trago ás baforadas
as imagens
sobrepostas
entre portas
d'outras eras
Só quimeras
alucinadas fantasias.
que em êxtase fenecem
nas brasas
de todo dia...
Márcia Poesia de Sá.
Almas de Vento
E de que metade nos assemelha o sabor?
a coloração tácita do cérebro
um elo entre o visível e o invisível
- Quem somos nós?
Prendemos versos entre anés do infinito
onde o fogo arde a dança néscia
um alimento ao irreal impossível
Não estamos sós!
Poetas das entranhas benignas
malditos seres com almas de vento...
- Quem somos nós, rastejantes?
ou voadoras flechas do intelecto?
Somos os prestiditadores dos signos
bardos confinados às letras e cantos
não estamos sós, mesmo distantes
nas sonhadoras curvas do dialeto
Inquietamo-nos sem saber...
aquietamo-nos por preguiça!
somos o raio que simboliza
e a dor que agoniza
inocência e malícia
de escrever.
Márcia Poesia de Sá & Wasil Sacharuk.
Rendo-me, conduza!
Conduza-me por entre passos
de pernas que se espelham
Leve-me consigo ao seu mundo de rubis...
Fecho os olhos, seguro sua mão
Entrego-me, rendo-me
Conduza-me aos insanos veios
traga-me os aromas de teus loucos jardins
faça-nos cruzar os portais de Atlântida
vendada e muda, quieta e surda
indefesa ardência
Conduza-me ao incêndio !
Conte em meu ouvido todos os contos
que destravam os cadeados,
que dilaceram as cordas
em raios invisíveis de neon
Dance comigo nas alturas do sonho
vamos morder a lua?
lamber a luz?
enlouquecer?
Conduza-me lentamente
ferozmente
vorazmente
ao seu insano mundo
E ao me entregar,
sei que sentirei na língua
o mais ardente sabor do instinto.
Que goteja incandescente
sobre a canção e o mar.

Márcia Poesia de Sá.
É na delicadeza da brasa,
que mora o balé terno do morno
(na cadência lânguida do tempo)
e é no morno do carvão,
que eterniza-se o fogo
em labaredas de memórias.
De Sá.