sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Só.
Só esta liberdade
atada aos pés descalços
que sobe e desce as ladeiras
da quente Olinda,
Avista trôpega ainda
a paisagem
que ao longe
se refaz de um azul
molhado
E a chuva que caiu
logo cedo nos telhados
evapora
E implora
como imploram
para viver, esses
meninos.
Só a liberdade
vê este menino
o menino que chupa
ávidamente
um picolé verde
Do outro lado da rua
estica-se faminto
o olhar de outro menino
este suga o vento
é arrasta
pelas
ladeiras da quente
Olinda...
Um carrinho
amarrado de cordão
e lata
Lata de sardinha
seca como
o verde
da esperança
que descansa
esquecida
Na liberdade
frágil
dessas ladeiras de
Olinda...
E uma menina
atravessa a praça
saia de flores
pernas de horrores
ri de pirraça
Nas escadarias da igreja
sobem os cegos
tocam os sinos
- morreu um dos meninos !
Ninguém viu
estavam rezando
E o picolé verde
derrete-se
no chão...
sem sorte
sem sonho
sem nada
nas pedras quentes
da escada
Da liberdade franzina.
Márcia Poesia de Sá.
Fome
Tua fome
não compreende minha fome
Tua fome
não alimenta-se de minha fome
Tua fome
não faz agir tua mão de homem
Tua fome
não faz cessar meu codinome
Tua fome
sequer lambe meus desejos
Tua fome
é falso anseio sem traquejos
Tua fome
é um verso mudo
rasga um muro
corre o leito
Tua fome

é teu rufar dentro, teu peito !
Tua fome
tem eco gordo e rarefeito
Tua fome
esta fome...de mim
É uma ilusão evaporada
na sua falta de coragem !
Minha fome
é esta palavra no cais...
Minha fome
é a espera de um nunca mais
Minha fome
é feita de dentes
que te penetram as carnes (de dentro)
Minha fome
nada fugaz,
te deseja
saliva
respira
vive
e morre
no silêncio
de nossa
paz.
Márcia Poesia de Sá - 2015
Rendida
Rendo-me ao sereno
que abraça com seus longos braços
a tarde inteira...
Entregue,
parto
Não sei
o caminho das estrelas
esqueci
Tão breve
foi o sonho
com o sol
anoiteceu
esfriou
Sucumbiu
Na confusa
solidão
o
sereno caiu
como um lençol
de plumas
Sobre a
pele morna,
em chagas.
Márcia Poesia de Sá.
Sacrilégio
Quando as ampulhetas detectarem a hora
nos recantos espremidos da gaiola branca
e o ar, for completamente roubado 
do vento...
E as águas verdes, forem acinzentando-se
lenta e fervilhantemente
já não haverá mãos
para aferir os pulsos
Nem um único crepúsculo
para salvar a flor.
A vida vai empalidecer !
Deitada no branco
esfriará
Pincéis pelo chão
não pintarão mais nada
Quando as ampulhetas forem viradas
será tarde demais
para os tons
translúcidos.
O ar
vai sufocar em silêncio.
Márcia Poesia de Sá.
Passagem
E a água escorre
pelo negro vaso
pinga na pedra
seca, evapora
alimentou as raízes
na rapidez de um choro
se foi
liquida e transparente
carregando grãos de areia
com ela...
Márcia Poesia De Sá.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

... E do vento que sopra, sempre
Quando garota, eu ficava na janela, no sexto andar a conversar com o mar, e ele por tantas vezes mudava de cor, ora prateando-se serenamente nas manhãs, ora esverdeando tudo como uma imensa paleta de morna esperança, ora engravidando de céu e num azul marinho se recostava ao horizonte e cochilava... e em outras horas, quando a madrugava cavalgava, ele enegrecia-se e só nas ondinhas próximas da areia ele piscava em branco que brilhava ! eu sempre gostei de falar com ele e ele adorava conversar com o vento. Depois, já um pouco mais velha, eu gostava de falar com o vento quando sentava na ultima serra nas terras de meu pai, e no silêncio da mata que brincava com seus bichos, eu ouvia o vento assoviando enquanto as árvores dançavam com ele um certo balé, noutros dias dançavam valsa, e noutros só deitavam as cabeças em seu ombro e ele as fazia mudar de tons de verde enquanto as embalava baixinho, numa ternura tão grande! ... é, eu, menina ainda via a tudo isso enquanto rabiscava meu caderninho. E os anos foram se passando, então houve um tempo, em que eu falava com o vento só as pressas, quando ele invadia a conde da Boa vista e fazia brincadeiras em meus vestidos, eu brigava com ele, mas ele saia rindo avenida a fora e nem me ouvia... depois, nasceram meus filhos e ai o vento vinha dar-lhes beijinhos nos fios dourados enquanto eles dormiam no meu colo, ou quando brincavam de pega entre uma corrida e outra, o vento brincava com eles e eu o via... esse vento que por toda minha vida me fez pensar. Hoje eu ainda o vejo, as vezes mais velho, mais calmo e tão mais sábio, as vezes parece criança brincando. Ainda leva meus filhos para os trabalhos enquanto eles aceleram por ai...ainda visita um a um os poetas quando eles abrem suas janelas, ele esteve em Pelotas também, abriu casacos, assanhou os cabelos, assoviou, cantou e riu muito !...este meu amigo vento até parece que está sem estar, já que na verdade ele está em todo lugar. Agora por exemplo, olhem só que coisa ! o vento está fazendo rodopios dentro da minha cabeça, e já fez revoar um monte de poemas que estavam guardados na caixa das memórias...
- ôh senhor vento, se comporte !!!
- eu?! eu não...diz ele sorrindo.
E partiu cabeça á fora, dando cambalhotas ...
Márcia Poesia de Sá - 2015..
Chave Dourada
A Fada da Mata distribui as cores
numa tela retangular
deserto em figuras ricas
surgem flores dispersas
azuis, violetas, amarelas
espalhadas pelos cantos
no alto do morro um olho
na retina azul esverdeada
há coração vermelho
nele, a chave dourada
espera a mão de um Poeta
que dirá as palavras certas
e abrirá a porta
só então as borboletas
as mesmas que voam
uma ou outras vezes
serão totalmente libertas
espalharão-se por toda a obra
como um manto colorido
não haverá discórdia
quando o ombro é amigo
tudo ficará bem... sem sacrifícios!
Dhenova
Toquei a pele
Caminhei tão leve
por entre brisas tênues
nada mais que passos
nas areias sorridentes
Segurei as mãos
e as canecas rubras
e as madeiras cinzas
sofridas e tão fortes
do distante trapiche...
Segurei o choro
e o isopor...
não segurei o amor
este eu soltei nos ventos
nos olhares, nos risos...
Segurei a pele
deste tronco dançarino
alegre de tão lindo...!
com folhas faceiras
De um verde andarilho...
E deixei a folha da lembrança para ti
num cantinho escondido do meu riso.
Márcia Poesia de Sá.
Nós e o tempo
Eu queria escrever o tempo inteiro
mas o tempo, este garoto tão matreiro
jamais se entrega por inteiro
Ele é como neblina nas manhãs
vem, encanta, quase nos cega,
e logo depois, se desfaz...
Eu queria conter o tempo todo
mas este tempo, assim como eu
não se permite engaiolar...
ele tem na derme o gene das brisas
ensolaradas das pistas
por ondem percorrem as histórias
sempre em altíssima velocidade e sem destino...
Eu queria muito guardar o tempo
quiçá numa caixa de porcelana
com uma pintura antiga...
Mas este tempo presumidamente guardável é utópico
Então me resta esses instantes sóbrios
onde busco-nos nas memórias
enfileiradas e tão bem arquivadas
deste tempo que já se foi...(será?)
Olha ! encontrei um arquivo !
nele o tempo estava ensolarado e sobre a linha
a minha letra dançou com a tua
num poema imortal de tão lindo...
Sinto um perfume de mar, sentes?
Márcia Poesia de Sá.
Ao Mago da pena.
( O acolherador !)
Tu que do vento uivante fazes versos
e que do frio intenso fazes queimar esperanças.
Tu que com esta vida brincas de criança,
e escreves amalgamando distâncias...
tu que ousas crer no improvável
e com total talento ensinas o inabalável
desejo de melhoras e sonhos reais.
Tu que começastes sozinho a unir pedrinhas
e a brincar com palavras, formastes linhas
de um conto especial que jamais finda!
- Meu muito Obrigada !
Tu que sugas o verde amargo
e sopras os mais densos e doces verbos
sobre o horizonte da página antes, brancas
deste pseudo acaso literário.
Hoje vejo não uma, mas muitas páginas
e mais páginas se unem a nós,
neste teu, e hoje, nosso infindo livro de abraços.
E é a tu, imensa folha imã de nós todos,
alguém a quem me orgulho de chamar de amigo,
que venho hoje, assim tão simplesmente agradecer
e de todo meu coração queira saber,
sou do teu sonho, da tua amizade e do teu riso,
um ser inteiro e eternamente cativo !
Márcia Poesia de Sá. 2015
Ousadia
É meu amor, aproveite o som dos ventos que sopram tanto ai perto de você, abra as janelas do medo, escancare-as de vez !
Deixe que ele faça revoar todas as listas dos medos que já não fazem mais sentido nenhum. Veja que lindo balé elas dançam em rodopios mágicos, quando se aproximam da porta que leva para o para sempre, acene um adeus agradecido, eles tiveram sua missão cumprida no tempo, te protegeram de possíveis erros ainda maiores, mas deixe-as ir... apenas ir...
É meu amor, já colocou água nas plantas hoje? coloque agora!
e antes, coloque água para esquentar, prepare algo bem gostoso para aquecer teu corpo por dentro, sinta cada gole que desce como um carinho meu e olhe para o céu ! nunca importou a cor que ele está agora, veja o que desejar, pinte seu dia com cores próprias...e observe a arte toda pronta, radiante e internamente agradeça.
Sabe meu anjo? me perguntam sempre de onde vem esta minha paz e alegria, acho sinceramente que vem desta mania de ver beleza em pequeninas coisas. Tenta...não é tão difícil se eu consegui ! vejo uma profunda beleza na luz que invade cada gota que cai no chão, vejo cor e tons no lodo que toma as paredes, vejo vida nas heras que crescem recobrindo as rachaduras de minha alma, vejo alegria em cada pássaro que canta mesmo que para fazer silenciar meu pranto...e conseguem.
Tenta amor ! mesmo quando tropeçares e quase caíres, sorria de você mesmo, gargalhe ! teu riso vai apagar qualquer coisa menos linda que ele...acredite ! sorria de sua cara feia, brinque com ela ! um dia você acostuma-se e então vai te parecer que todo riso é mágico. Ser inocente tem lá seus afagos n'alma.
E se um dia der tudo errado, o carro quebrar, o tempo fechar, a saudade apertar demais, faz assim...chora um pouquinho...mas só um pouquinho tá? é importante lavar a casa antes de receber visitas, deixar tudo cheiroso. Depois do choro, senta em um lugar lindo ( se não der para ir, senta dentro de você mesmo) e brinde com felicidade genuína a sorte de estar aqui...há lições que a gente só aprende muito depois que elas passam então sorria...dê a você e ao tempo a honra de serem teus mestres.
E sempre, ouse !
ouse como eu ousei e ouso e prometo:
para sempre ousarei...
Ser feliz !
apenas isto : " ser " feliz !
até mesmo quando não estou muito feliz
Porque aprendo sempre com a vida que o verbo ser é muito mais importante que o verbo estar.
Seja feliz, ame-se
Porque eu te amo ! Emoticon heart
Beijo mais que terno na alma, coração e mãos.
Márcia Poesia de Sá.
E da profundidade úmida e ainda escura da mata que docemente prateia com ínfimos raios de sol quando os relógios da manhã ainda se espreguiçam sonolentos, vejo subitamente sobre os quadriculados da armação da porta, dois passarinhos em dúvida do que fazer. Seus pés são frágeis. Mesmo assim, numa confiança inconfundível das asas, revoam sobre a placidez da manhã, soltando pelo ar a magia da criação que se expande em meus olhos...
Emerjo do ostracismo, num olhar que, lânguido, se esgarça num silêncio que grita. Meus pés caminham como se ainda pisassem nas nuvens dos sonhos que a noite soprou e entre o espanto e o encanto, me posto diante da cena, do sobrevoo amplo das aves que visitam meu canto, e já tão cedo. Como um balé sem ensaio beirando a perfeição. Desperto, olhos chuvosos de gratidão e respeito por permitir-me a essa visão... O pensamento acompanha a coreografia. A alma respira e vibra. O corpo responde vida...
E a vida vai assim, como um acaso brincalhão, caindo de meus olhos como um caramanchão de flores trepadeiras de violáceas vibrações, quando um e outro entram na casa, brincando de estarem desnorteados, mas tão sorridentes por se saberem seguros num lar que os abriga. E a todos...
E eu, estátua apenas, mesmo com o coração aos saltos salto de vez para o mundo dos sonhos e começo a escrever este conto enquanto ainda ouço ao longe o bater das asas desta felicidade tão sutil que há pouco ultrapassou a porta e seguiu a sua busca de ninho. Assim como nós humanos que buscamos ninho em nuvens de vento.
Sigo a dança que avança rítmica por todo espaço da casa, agora entremeada pelo canto macio e leve que me faz flutuar.
Então, minha alma agradece aos parceiros com um breve aceno.
Até amanhã, passarinhos - peço eu, em silêncio. -
E eu que nada sei
sobre o que ousei saber
que tateio o meio do caminho
como sendo esteio
Replanto as esperanças uma a uma
e aguardo com a tranquilidade anciã
o brotar de brotos do inverno
E eu que brinco de sonhar
com as estrelas
e pulo corda com a lua
ainda acredito
que depois da chuva
um sol espreguiça-se logo ali
Então, logo eu
que rasguei e rasgo medos todos os dias
acendo uma fogueira
e decoro com bandeirolas
a noite dos estrondos sutis
e... adivinho as danças de roda
e os abraços
que ainda serão dados
quando o mar beijar a areia.
E finalmente
Mares virarem oceanos.
Encontro
Márcia Poesia de Sá.
Dos relógios que se reproduziram nas gavetas empoeiradas
nada tenho a dizer, sou como o silêncio deles
esqueci as horas
entre aquele jantar e um café da manhã
que nem tomei.
E nem sei dos bolsos vazios do antigo terno
nem daquelas botas descoladas
de tantos caminhos que deixei de fazer
nada sei, nada mesmo.
Contudo ainda guardo na memória
todos os suspiros daquele mar prateado nas calmarias
de tantas manhãs...
E ainda reconheço a fome das algas
que se suicidavam na orla
á espera de um mar que nunca vinha do outro lado
Surdo na pele, eu ainda guardo
o som, a frieza da areia
os passos nos quais eu ia e voltava
sem qualquer interferência
Guardei o perfume da maresia
e teu beijo
antes do meio dia.
Os mares e marés.
Márcia Poesia de Sá.
Um poeta
é feito de uma infinidade de olhos numa só retina
de tímpanos apurados para os silêncios
e de uma pele que enxerga mais que a visão...
ou quase isso.
E desta inexatidão
ele exprime as reticências.
acho...
apenas.
Márcia Poesia de Sá.


Encontro NOP - 2015
Pelotas - R.S.

Poetas : Wasil Sacharuk
              Andréa Iunes
              Rogério Germani
             Anorkinda Neide
             Márcia Poesia de Sá.   

Vento ingrime.
Sei que emigrei de mim
e há anos o fiz
perdi as rotas, endereços
razões e cidades...
Emigrei de tudo que era e fui
hoje, rarefeito é o ar daquela estância
e sem constância ou ternura
olho as páginas que descoloriram-se
A estrada que sigo hoje
não é adaptada a retornos
é uma subida ingrime
extremamente perigosa
onde nem penso em parar
Ontem eu vi um pedregulho
que se desprendeu do sonho
e rolou ladeira a baixo
estilhaçando o vento
que seguia até teus olhos
Ontem vi os farelos
que te cobriram
empoeirando as imagens
como um filme antigo...
sem título ou data.
Levantei e segui
afinal, meus horizontes
ainda dormem no amanhã.
Márcia Poesia de Sá.
Curvas insolentes
Meus passos já cansados perpetuam-se de verde,
sigo...sigo infinitamente.
Avisto a curva que se abre aos poucos,
traço suntuoso de paralelas nuas.
Há nas estradas deste tempo tantas curvas.
Paro, penso e apenas sigo,
minto da reta a verdade da curva
e o vento me acompanha as cambalhotas.
Folhas laranjas vão pintando a paisagem,
e os assovios dos bambus fazem musica para mim.
Após o sol e duas luas,
chego finalmente ao ponto que penso ser o final,
passo pela porteira...
Arranco uma florzinha,
esfrego os olhos e o que avisto?
A maior de todas as curvas,
o retorno definitivo ao âmago de mim,
cheguei nas transparências das cascatas
e entre rochas e peixes vermelhos
o som de água me acalma.
Curva definitiva,
após o ponto que eu mesmo risco.
Que seja, pois é o fim do abismo,
e a chance universal da reta infinda.
D’alma poética tantas linhas...
Choram em silêncio eles e o ultimo traço.
Após a porteira eu passo...
apago a curva e apenas sigo.
Márcia Poesia de Sá . - em algum ano que já esqueci.

O silencioso som das casas.
Os edifícios namoram entre si e ruas que se estupram nas esquinas com sinais de três cores, e em seus olhares que sempre buscam horizontes do mar cada vez mais distante, raro e inquietante como as distâncias dos lírios, raramente o encontram, o mar sabe ser exclusivo ! Nua e líquida criatura que só se entrega a olhares navegantes...
...e muitas vezes preocupados com seus barulhos internos, eles, os prédios, cegam suas janelas...as deixam nubladas por incertas visões, pobres edifícios. Tão cegos e cheios de olhos oblíquos.
Por isso, ainda prefiro as raízes das casas quietas, que apenas tem poucas janelas para abrir...e de dentro delas sempre exala um cheirinho de um único lar.
(Algo de panela á fervilhar e portas que se reconhecem...)
E até mesmo quando se escancaram as portas, só namoram com seus próprios jardins. É, as casas, definitivamente, são mais fiéis.
Márcia Poesia de Sá..
Queria
eu queria poder romper os fios
que permeiam a fibra do papel
que guarda o desenho do mundo
eu queria poder num piscar
adormecer as distâncias
que amputam os abraços
eu queria saber pintar o toque
que perpetua as células das saudades
eu queria compreender os cheiros
que se mantem intactos
na pele das flores
ah...eu só queria..
juro que queria
saber voar.
E abraçar o verso
antes dele ser escrito.
Márcia Poesia de Sá - 7.11.15
Quando a tarde
vai escorregando pelo pano da noite
que desce lentamente
algo em mim muda !
é como se minha alma fosse se abrindo
preenchendo-se de uma calma mansa
e esta terna certeza de que algo exala
minha pele aquece ainda mais
o coração desacelera
tudo corre como um riacho
é, acho que minha tez reconhece
o perfume das estrelas.

Márcia Poesia de Sá.
A mulher do vento
Visto-me de negro
coloco um capuz de sombras
e caminho pela ruazinha
de pedrinhas pequenas,
apenas iluminada
pelas lamparinas
uma aqui, outra mais adiante
vejo sombras cambaleantes
pouco mornas
quase ausentes.
um tanto mortas...
Uma fumaça ou uma neblina
baila na esquina da rua
e a carruagem passa sem alarde
Eu, tão invisível
como a fome dos desesperados
caminho calmamente
até a ponte de ferro.
Lá o vento intrépido e ousado
faz amor com a água do rio
mas ninguém vê...
uma flor desprendeu-se do galho
o gato preto miou
o mundo caiu no rio
Mas ninguém viu
Eu, vestida de negro
caminho sozinha
pela linha da loucura
toco a face da noite
sinto o ar gelado
calo-me.
o frio, que só se abranda por um instante
quando degluto um gole de café
em um bar da esquina do cinema
O cinema está fechado
nenhum filme em cartaz
volto caminhando
pela estradinha de pedras pequenas
subo as escadas
tranco as portas
fecho as janelas
olho os cadernos sobre a mesa
pego com força a cadeira,
aproximo-a da mesa
agarro-me a pena
e vou embora.
Márcia Poesia de Sá.
Conto de fadas acontecem
A vida é uma surpresa
uma estrela que se desprende do céu e descamba
um vento que leva as roupas do varal
um escorregão na água
um riso inesperado
A vida é uma surpresa
uma ligação de um amigo distante
um fruto que amadurece subitamente
um beijo roubado
um cafuné terno
quase sem se notar...
A vida é uma surpresa
um pneu que murcha
só para você ouvir um passarinho cantar
uma carta que chega
assim gordinha de saudades !
o encontrar da lua
A vida é uma surpresa !
e não podemos esquecer disto...
é um sol que rompe a manhã
é o amor que teima em respirar
uma paixão sem limites
você abrir os olhos e ver, enfim
A vida é uma surpresa
respire e aproveite
enquanto ainda é tempo...
E sonhe! sonhe muito...
pois as surpresas estão esperando
para acontecer...Emoticon heart
Márcia Poesia de Sá.


Desejos delirantes
Eu quero o verbo
aquele que destoa...
o que sai rouco e tonto
emocionado e risonho
chorando ou pulando...
Eu quero o verbo
o verbo nu, enrolado na toalha
o verbo perfumado que caminha na areia
e deixa o perfume exalar no vento
Eu quero o verbo solitário
olhando a chuva lá longe...
quero o verbo que submisso
se equivoca de vir e volta sempre
Eu quero o verbo !!!
o meu verbo, o teu verbo
e o verbo que seguiu em frente
se perdeu no ventania
comeu caqui maduro na esquina de Berlim
Eu quero o verbo indecente
decadente, e o ingênuo
também, que docemente sorri...
e fica rubro de amor
Ah...eu quero o verbo !!!
o verbo ensolarado
o verbo que incendeia
e o que prateia ao namorar a lua
o verbo embriagado
endiabrado
e o verbo santo !
Eu só quero o verbo!
o restante, deixa o olhar assim, bem distante
da um gole na noite, sente o cheiro do ar
e me verás passar...
Márcia Poesia de Sá.
É de preto e branco que pintam as coisas que parecem passar
ilusória ideia das paletas que insones, esquecem-se de ousar
Pousar na tênue linha que divide o mundo e soprar suavemente
é um exercício dos loucos, pintores e dos poetas. Façamos pois !
É de preto e branco pintado, os poemas que dormem num papel?
que irreverência pequena ver só isto...
as cores que existem nas retinas, dormem encantadas em cada linha
e mesmo que os relógios gritem, que as datas se sobreponham,
que digam que morreram, mentem.
as cores, essas travessas meninas,
continuaram lá, mesmo que escondidas nas linhas,
e saltam como crianças !
na face de qualquer um que as queira ver...
Na paleta da emoção, há um furacão que explode cores
e chove em gotas que derretem-se no mundo
dos que enxergam as entrelinhas.
Preto e branco das linhas
Márcia Poesia de Sá.
Febre
que arde dentro
que arde fora
que arde...
E que na pálpebra
pisca, enraíza e explode...
febre
que soma a química
que infringe a léxica
que morde a língua
febre que me adoece
que me cura
e que me apura...
febre de termômetros sutis...
coisa de verso e de verve
coisa que emana
debanda
e some...
Marcia Poesia de Sá