domingo, 29 de maio de 2011


Ele

Que veio revoando com a calma das gaivotas

Em manhã de calmaria no mar

Quase sem as asas movimentar

Encontrando-me placidamente deitada

Em meu destino

Ele

Que soube pousar no penhasco

A escutar minhas lágrimas

Sem nada falar

Ele

Que de tão terno nem parece carinho

Parece mais uma gota de orvalho a umedecer

Minha alma

Ele

Que de tão amigo nem parece outro

Mas eu mesma em espelho

Ele

Que adormece em meus braços como criança

E acorda sorrindo

Só por estar

Ele

que é mais, muito mais

Que sonhei

Ele

Que me relembra os caminhos

Os quais não seguirei mais sozinha

Que me abraça no frio

Que aquece meu desalinho

Ele

E recompõe meu sonho

Seu sonho, nosso ninho

Ele que canta baixinho

A canção do amor

Ele

Que fala com calma

Mesmo em meio às guerras de mim

Ele

Que exatamente por ser assim...

É o grande amor da minha vida

Ele...

Só ele, e fim.

Márcia Poesia de Sá – 29.05.2011

quarta-feira, 25 de maio de 2011


Dedos e desejos

Doar-se-iam ardores
Amores em êxtase
palavras, açoites
calores e beijos

Desejos em linhas
poemas tão quentes...
flamejam as mentes
e os dedos em riste

Paixão de palavras
e gotas em frases

Escorrem vontades
na boca da folha
que lambe o papel
da pena que arde.

Márcia Poesia de Sá

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Eu sabia

Tentei recompor todas as borboletas, e usei todos os vernizes que pude. Costurei asas partidas, contei a elas as histórias mais aladas. Até pensei que haviam acreditado.
Depois eu mesma salguei o mar, salpiquei estrelas nas areias e espalhei a cor difusamente entre os peixes do coral.
Embarquei numa viagem sem fim, para além de mim, e para onde eu jurava que jamais retornaria. Degluti toda a minha maresia, digeri as magoas, as águas e os rios poluídos do passado, despenquei da cachoeira mais alta de meus sonhos, cai languida, tão certa de que pisava o solo das verdades...que nada...
Acordei partida, quebrada...
Na maca dos sonhadores anônimos. E havia perto de mim só um recado da borboleta:
- parti.

Márcia Poesia de Sá

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Como mina



Estou aberta as tuas buscas

E tu me exploras as entranhas

Na incansável tarefa de me encontrar

Temo ser apenas mina morta

E a única esmeralda encontrada

Seja o brilho do teu olhar

Cansada adormeço ao relento e desejo...

Que teu sono seja tão profundo quanto teu silêncio

E meus brados calados na garganta

Fazem-me chorar

Teu perfume invade meus vazios

Tuas mãos macias a desfilarem em minhas rochas

Derretem-nas

Sou apenas uma cratera

Uma imensa caverna

Só a te esperar...

Mas se um dia

Uma jóia encontrares

Leve-a contigo

Para a eternidade

Do nosso impossível

Infinito.

Márcia Poesia de Sá – 13.05.2011



terça-feira, 10 de maio de 2011



Por que os sinos dobram?



Para lembrar-nos que estamos vivos?

O inverno já rasteja e aproxima-se lentamente
Silencioso e decidido...
Agarrando-se as folhas das arvores que permeiam meus olhos
E o peso de sua chegada as derruba...

Vejo-as rolarem pelo chão ao sabor do vento, e penso...

Para onde será que estão indo?
Nos ninhos escuto janelas fecharem
E a catedral aparentemente inerte
Segue com seu canto solitário

As esquinas já me são tão distantes quanto o infinito
E eu assim, finito e recluso em meu abismo limpo
Apenas observo as gotas que o céu chora
E que agora colam, nesta vidraça fria

E mergulho de olhos fechados no som dos sinos
Insistentes criaturas a invadirem o branco
tão solitários quanto eu...

Alma tenta respirar o ar da vida
E a morte... Já deve ter adormecido em outro lugar.

Márcia Poesia de Sá – 10. 05. 2011

sábado, 7 de maio de 2011

VULCÂNICA

Vulcânica e abrasiva
derreto o gelo de tuas palavras
a língua de minha alma
a percorrer mentiras torpes

Flamejantemente verídica
escorro por tuas paredes nefastas
corroendo o mel de tuas lástimas
num profundo fumegar de adeus

Empírica e resoluta
ateio brasas nos teus olhos surdos
acordando a ilusão sincera
diluída em mármores imundos

E se me calo...
silenciando mansamente minhas verdades
não esqueças que sou vulcão sereno
adormecido por mera comodidade

Mas quando falo..
vomitando internamente minhas lavas
não esqueças que sou vulcão extinto
com uma fome desesperada de jorrar.

Lena Ferreira & Marcia Poesia de Sá

sexta-feira, 6 de maio de 2011


Alicerce dos sonhos


Adormeci na madrugada de uma meia idade indecisa e acordei anciã da juventude perdida, catando cartas de amor de um remoto tempo, colhi as flores já secas dos momentos, e reguei-as com chumaços de algodão.
Observei balançando-me na janela da vida, e vi subirem e descerem as ladeiras dos anos. Os meus sonhos sonhados em areia movediça. Engraçado vê-los tentando sobreviver... Do alto de minha janela fictícia, tentei jogá-los cordas de experiências, gotas de ilusão, e copos e copos de fé. Mas mesmo assim nada adiantou. Saíram ladeira a baixo caindo, caindo...

Sonhos inteiros virando destroços, pedaços apenas.
E após a vertiginosa e quase fatal queda, ainda me foi possível ver pequenas pétalas amassadas que largaram pelo caminho.
Catei algumas e as guardei na carteira, para lembrança do ontem que se extingue em meus olhos já úmidos de saudade. E aprendi.
Que se um dia plantar novo sonho, procurarei um solo mais risonho, mais forte, mais conciso e em nada arenoso. Quem sabe a colina ao pé do abismo, com rochas de um para sempre, que possam segurar fortes as raízes das mentes, que tenham densidade suficiente para agarrar as raízes dos meus sonhos, e permitam florescer assim, a emoção.


Márcia Poesia de Sá – 07.05.2011

quarta-feira, 4 de maio de 2011


De que adinata?!

De que adianta cavar tantos mundos buscando o inesgotável visível, se tudo que verdadeiramente me toca não pode ser visto, nem tocado?

Bem, eu o toco! Ele tem cheiro de flores nascidas após a nevasca, e uma tonalidade arroxeada... a sensação dele na pele, é quase igual a sensação de uma pétala de rosa recém colhida passada lentamente numa pele cujo dono dela tenha os olhos vendados. E o perfume...?

Ah... o perfume merece uma estrofe só para ele. Tem cheirinho do eterno, da eterna memória celular... Que se aproxima de um borrifar de aconchego, colo... Seios... Abraços mornos e aromas.

O gosto dele na minha mente, tem um gosto de vôo...certamente algo que me leva do chão, me tira do momento presente....e ausente me desdobro em varias, tal qual minhas papilas gustativas...viro língua de sentir só para sentir-lhe a carne...e na mente ele se esvai como uma lembrança doce...

É muito difícil descrever o que só se sente na alma. Somos seres captadores de sensações e nossos computadores mentais não estragam a memória... nem aceitam substituições.

É difícil... Muito difícil ser poeta e continuar humano.


Márcia Poesia de Sá - 03.05.2011