quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Noturno Manto

Não vês as sombras que perpetuas?
(d'uma magnitude esplendorosa!)
que queima minha alma
e a tua boca adoça!
Fazendo-nos espectros sem luz?!

Não vês que compactuas com o silêncio?
pintando numa tela tons pastéis
rascunhos de momentos tão cruéis
vagando na insensata teimosia?

O amor não merece rejeição
é tímido, é doce, é imensidão!
se ajeita pelos cantos de teus frios
e treme sem a tua compaixão!

Não grita, nem chora ou esbraveja
o amor só se entrega a esta tristeza
de amar-te mais que a vida!
e ainda assim, deixar-se fenecer...

E acabrunhado pelos cantos
estremece em soluços sem prantos
aconchegado a este gélido manto
que a noite inclemente, insiste em o cobrir.

E assim, entrega-se a nostalgia
de amar-te além da noite e todo dia...
Até já não poder aguentar mais!

Márcia Poesia de Sá - 2014
Ouvindo o vento

Daqui deste pequeno recanto donde olho as estrelas neste instante, parece-me que ouço tão mais que estes bucólicos sons que escorrem pelas folhas da mata. Um ou outro estalido de quem como eu, anda a caminhar na noite, quiçá em busca d'algum sentido para qualquer sonho. Paro para olhar aquele cintilante brilho que mais parece que uma estrela explodiu na negra e úmida floresta, que como uma sábia senhora me retorna o mesmo olhar que a dou.
Sentada aqui nesta mesa que agora é fria, só observo, eu só olho o mundo como uma obra branca do mais puro mármore, e em minha mente a placidez do branco se esgarça e se encolhe numa dança que invade cada entranha, e ao esfriar tudo por dentro, assim, lentamente, foge-me dos olhos algo que de cristal pinga.
Eu não entendo muito dessas coisas fugidias, e jamais entenderei algumas feras que bradam pela noite como máquinas furiosas a cortarem quilômetros de asfalto e pó. Em mim sempre viveram raízes e brotos, folhas e frutos que aprendi a esperar a maturação, eu não absorvo a pressa mas também não compreendo desistências vãs e não me atento aos arranhões que a vida insiste em me dar. Como garota que cai na areia, apenas levanto, tiro o excesso e sigo.
Daqui deste lugar onde á noite o laranja das paredes vira vermelho, sinto-me presa num rubi falsificado, que amanhã cedo, nas primeiras horas do sol irá dourar-se completamente, e o sol inclemente sequer pensará nos veios vermelhos que por dentro de mim ainda estarão inflamados pelo silêncio da madrugada. O sol nada entende de memórias abstratas, o sol só compreende o fruto e nada mais.
Ouço uns suspiros cansados de algumas almas exauridas, e o falar baixo de alguns cavalheiros de armadura, uma dama risca segredos em uma página de papel, depois amassa-os e joga pela janela da vida. Quem será esta imagem que me invade a mente, vejo-a tão clara e no entanto não a reconheço as feições apenas sinto que sua alma chora.
E é neste inefável silêncio onde abandono-me, neste dedilhar duma busca inútil, que vago por corredores internos, brancos e gélidos como o vento que agora sopra da mata para dentro de mim. Rodopia nas rochas e esbarra de leve em meu coração, que pulsa como se não mais pulsasse. De tão calado não bate mais, ele só contrai-se e expande-se num balé triste que me leva a pensar nesta insistência tão sem propósito.
Uma estrela acaba de despencar do manto azul marinho, e percebo que já não me restam desejos a serem pedidos. E sentindo minha alma aprisionada nesta densa rocha, tão branca como o silêncio, não identifico bem o que sinto, e me calo enquanto meus olhos apenas acompanham a frágil dança da fumaça que como eu, desaparece no ar sem deixar rastros.
A esta hora, nem a alegria dos pássaros coloridos me salvam de meus abismos, não ha qualquer ser que se alegre por aqui, está escuro demais na mata hoje! e um sentimento de vazio absoluto me toma em seus braços e beija minha boca com sua língua ardente e feroz como uma lâmina de bisturi.
Esta sensação tão familiar de vácuo, eu não sentia ha meses, conheço cada reentrância deste sentir e é como se miseravelmente eu tivesse voltado para casa. Mas hoje não é a mesma casa, é outra, ainda mais cinza que a antiga e ha mais teias de aranhas nas portas que insistentemente batem e ecoam pelas escadarias de mim, numa sinfonia tétrica de um mais que absoluto nada. O espelho trincado continua trincado e sujo pelo tempo, não vou passar por lá hoje, vou dormir aqui mesmo onde estou, temo não enxergar nele meus olhos vitrificados e temo ainda mais, nem isto ver.
A mata agora ressona, imagino com o que ela sonha. Como também imagino no que sonha o pelo negro que abraça um único facho de luz que consigo ver, e derrama-se da lua em sua pele faiscando pequenos cristais em meus olhos, mas eu os fecho pois hoje não ha mais lugar para nada que brilhe.
Talvez seja esta mesmo, a sina das florestas, viver toda a alegria e festa das manhãs, lamber a fome de seus filhos e alimentá-los regiamente, acalentar os ninhos que proliferam-se em seus braços, ver na retina da vida tanta vida...
E á tarde amornar-se como um embalar de filho no colo, beijando cada ninho repleto de pequenas famílias que crescem todo dia e abrir os braços aos raios mornos do sol que já cansado despede-se e caminha ao seu leito do outro lado do mundo, e sentir suas raízes aos poucos esfriando, sugando a seiva da terra que também começa a gelar á espera da lua, leva-la a suas folhas, soprar o ar para os seres da noite. Sempre tão famintos de tudo.
Enfim, quem sabe seja mesmo esta a minha sina, trazer a vida, a poesia e a cor para depois morrer. Como morre o sol todo dia, quem sabe eu tenha estado tempo demais perto desta mata e tenha com isto aprendido a anoitecer de uma forma tão densa, que nem eu entenda.
Então, se é mesmo este o caso, preciso urgentemente fugir para um cais! um dique, um ancoradouro qualquer donde eu não mais veja esta escuridão que esfria-me tanto por dentro. Sinto que preciso de velas e águas que me salguem por fora o que já é tão salgado por dentro.
Espero então neste momento que caminha para mim, e eu posso senti-lo, ver manhãs prateando-se de azul, e comer velas brancas com olhos de riso, como se elas fossem parte deste meu viajar infindo, pretendo mesmo escrever outro final para esta história, não sei se conseguirei ser entendida pelos que depois de mim, lerem minhas marolas na areia branca. Quem sabe o mar me seja brando.
Até porque acredito que onde quer que eu vá, levarei comigo as tantas raízes de minhas árvores que mesmo na distância de mim, ainda me falarão da seiva fria que sobe-lhes o tronco.
E da imensa saudade que sentirão de mim. Nesta triste herança de ser mais que apenas eu, mas sendo todas , numa só perdição, numa sina de letras que espocam na boca, e neste gosto de tantas vidas que me abraçam, apertam e estrangulam em madrugadas como esta, nas quais eu ouso ouvir o vento.

Márcia Poesia de Sá - 2014
Quantas vezes mais, terei de sepultar-me?!

E qual a distância de dias entre uma morte e outra? Já não sei. Meus velórios tem me sido por demais enfadonhos, sempre a mesma música, o mesmo café requentado, e aquelas conversas das quais eu sempre adivinho o final. Dia desses um amigo até trouxe um vinho, foi mais divertido daquela vez, ao menos depois da quinta taça alguém no corredor perto do garrafão de água mineral, contou uma piada e eu sorri. Como também sorri da Dona Eulália que ao tentar disfarçar seu fogo, tropeçou no tapete da entrada e saiu catando coquinhos na frente de todos aqueles sentados e disfarçados de tristeza. Sorri ainda mais das caras de reprovação, ah essas hipocrisias me divertem!
E aquele cidadão que trabalha no cemitério e carrega as garrafas de café para aqui e acolá a noite toda? coitado dele, passa todas as suas noites a observar rostos chorosos, vai ver por isso ele sempre fala sobre o tempo, hoje cedo ele dizia da chuva na noite passada que carregou os telhados da igreja da pracinha, e falou que o Padre Inácio saiu correndo lá de dentro de cueca de bolinhas azuis e brancas.
Pensei comigo, onde estava este senhor, para ver esta cena, ai que vontade de perguntar! mas acho que se eu falar com ele, ele enfarta coitado. Melhor eu só ficar escutando.
Maria Helena desta vez veio com outro vestido, eu já estava enjoado de vê-la sempre de preto com aquele decote irreal, e o coque feito com um palitinho japonês. Hoje ela veio de branco, vai ver cansou de tantas mortes minhas. E decidiu comemorar o ano novo de novo.
Meus filhos não chegaram ainda e já já serei enterrado, neste instante me arrependo de não ter pago a cremação. Maldita pirangagem que em nada me socorre nessas horas em que vejo que nada sou além deste decrépto corpo que morre e revive toda noite.
Uma piada contada por alguém sem humor. E lá vem novamente aquele cara da floricultura trazendo uns arranjos desarranjados, preferia que me jogassem livros na tumba! ao menos eu teria o que fazer esta noite..
- Atchin! ara! odeio cravos!!! que florzinha chata, feia e fedorenta! nossa senhora! joguem-me rosas cambada!
Acho sim que eu merecia rosas! plantei tantas rosas nesta vida! e agora só colho essa droga de velório insípido. Sabe? acho que queria era uma festa, todos bebendo e comendo porcarias, as mesmas que me mataram, queria era ver estralas, e ouvir música e brechar quietinho os casais que dançariam a noite toda entre mãos, beijos e risos.
Na manhã, quando a ressaca os abraçasse eu sorriria muito do canto do bem-te- vi que lhes doeria o cérebro. E ainda assim não seria hora de levantar, eu só levanto da morte depois de meio dia. Um dia ainda falo com os cara lá de cima sobre isso, já está bom de parar com esta palhaçada de me matar e me reviver. Quero que decidam-se de uma vez por todas, essa vida de sobe e desce está me desgastando muito.
Além do que, nem só de mortes vive um homem. Ando carente de amanheceres mais ensolarados, e de noites menos mortas.

Márcia Poesia de Sá - 2014

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Andanças

Trago agarrada a minha retina, algumas imagens que criei e elas não me saem dos olhos! Basta que eu os feche e lá estão. Fragmentos de tantas coisas, num lirismo perfeito de cada linha do riso, ou na doçura inequívoca de olhos grávidos de estrelas, e aquela tênue luz de um abajur confidente e tão silencioso quanto aquele instante quando te fito a alma. Trago na mente impregnados aromas e deliciosas faíscas que espocam de lembranças tantas, em ecos e repetições da memória que chegam a aflorar em minha pele, como uma passeata de pelos que levantam-se para reverenciar tua presença, como um sonho. Trago no peito uma esmeralda lapidada pelas horas em que meus sonhos tornam-se realidade, momentos estes, em que entre ondas cortando os céus, ouço o rufar da antiga eternidade, cuja tez guarda tanta verdade, envolta numa charmosa nostalgia e gotas do nosso perfume que enfurecido, eclode no ar. Laços e lençóis, como sinfonias amigas, de um Voyeurismo de sensações e sentimentos que navegam calmos pelos instantes, transformando-os em horas, tão magicamente...
e que nas manhãs sempre retorna a mente, como um sabor doce duma saudade quente.

Márcia Poesia de Sá - 2014.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Breve

Lenta
Lerda
Letárgica

Recheio de casulo.

Balança as asas
Badala as nuvens
Colore um mundo

E morre em poucos dias.

Márcia Poesia de Sá.
Acho-me
Esvaída.
Perdi o sentido
Emparedei a luz
n'algum facho
grávido
de 
breu

Márcia Poesia de Sá.
E uma agulha 
risca no disco
destoam as notas
e pula de susto
toda a melodia.

Márcia Poesia de Sá.
Casulo das asas

Me foi dado uns dons distorcidos, 
umas visões aprisionadas em claustros
e alguns sentires exagerados. 
Foi-me encravado na lâmina do peito umas saudades incandescentes, 
umas esperanças que jamais fenecem, 
e a insistência míope que a tudo crê
Foi-me pintado nos olhos, algumas nostalgias esverdeadas
e canções de outras épocas que não foram minhas,
e desde cedo sempre foi assim,
nasci com o peso das almas velhas,
num franzino corpo de criança que sempre lutou para respirar.
Meu pulmão não nasceu com toda a sua capacidade
mas a vida o fez aprender a puxar o ar para não morrer
e isso me fez hoje uma grande mergulhadora de terras liquefeitas.
Hoje meu ar é tanto que perco o chão com a facilidade das aves
E ainda consigo ver milagres,
onde o caos teima sua presença.
Não ha qualquer glória na morte!
a morte é como uma porta
que nos leva para tudo que o é aqui
E portanto uma inútil fuga.
Fui construída lentamente por pequenos cubos de açúcar
Favos de mel e duma doçura diversa e de alguns galhos de espinhos
que a vida tratou de cimentar.
Me foi dado uns dons estranhos...
como este de voar e ainda cantar alforria,
apesar do peso nas asas.

Márcia Poesia de Sá.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

"Eu não sou pra se acreditar, sou pra se imaginar e não conseguir..." 

Clarice Lispector
Lembranças ( ou Arquivos)

Decidi lembrar, e o ato de lembrar pode ser algo bastante interessante, pois passeamos por nossas gavetas, é isto, e bem assim que vejo. Nós vamos vivendo dias, experiências, amores, meses, anos, desamores, estações, lugares tantos lá fora e em nós mesmos e vamos como colecionadores fanáticos, guardando em nossas gavetas pessoais as coisas que achamos pela vida. Um dia percebemos que ha de se fazer uma limpeza na mente e ai percebemos o quanto havíamos guardado de tantas coisas, e começamos a usar um olhar mais critico sobre as coisas que vamos amontoando quase sempre sem critério. Sinto que o passar dos anos vão modificando tanto a nossa alma que em muitas ocasiões me pergunto: para que lembro disto? por que cargas d'gua guardei esta lembrança tanto tempo?
E nossos sensores vão assim ficando mais lubrificados e atentos, começamos a conhecer de longe memórias especiais e o volume imenso de lixo que nem merecem ser vistos outra vez.
Por incrível que isto possa parecer isto não significa que ficamos mais frios, no meu caso até adocei o crivo da memória e aperfeiçoei os controles que me permitem esquecer rápido o que me dói, ou machuca. Lembranças dolorosas podem doer por uma vida inteira portanto, não merecem ser guardadas. Na ultima faxina que fiz em meu reservatório de memórias, joguei tanta coisa fora que acabei ganhando um arquivo novinho em folha, de muitas gavetas e completamente vazio. No arquivo junto a este, ainda decodifiquei e arrumei em ficheiros as coisas boas da época da escola, aquelas árvores cortadas em forma de animais do Colégio das Damas, ficaram na mesma pasta do sabor da Frateli e dos cheirinhos das coxinhas feitas pelas freiras de lencinho cinza, simpáticas senhoras de riso fácil, lá também algumas folhas á frente guardei Fernanda, a professora de História, as rampas de onde praticamente voávamos, os jogos internos, ah guardei também aquela janelinha onde sempre provávamos as hóstias antes das bênçãos do padre Pinto. E nem preciso dizer que isto ocorria á revelia da linda freirinha que conversava conosco pela janela mas que sempre se virava de costas para pegar mais farinha. Lembro-me tão bem de tudo daquela época, da sala da diretoria, da sala dos professores, dos aromas e sabores, das amizades que duraram anos a fio e até das que se perderam pelas exigências da vida. O caminho de paralelepípedo que caminhava o colégio todo, e que até hoje é igualzinho, meus pés cresceram sobre aqueles retângulos cinzas, e é engraçado imaginar esta imagem. Interessante também é que as memórias do terrível professor de matemática ( Rômulo ou Rêmulo, sempre confundo pois eram irmãos) está ficando cada dia mais fluida e já quase desaparece do papel, e opostamente as doces lembranças parecem sofrer uma transformação de negrito. Agora penso neste efeito levado as outras memórias, memórias por exemplo de amores passados, será que este efeito também ocorre com eles, bem, dizem que o que pertence ao passado se não se mantém até o futuro é por não ter merecimento, mas será que é assim? será que exatamente por este efeito de atenuar-se as dores e enfatizar o doce, alguns amores do passado parecem ter sido mais belos que foram na verdade? não sei dizer, sinceramente não.
Pouso como se por milagre nas areias de Boa viagem, menina ainda que caminhava e sentia as areias lhe adentrarem os dedos e a alma, sinto o calor do sol que me queimava a pele, deixando meus cabelos ainda mais dourados, vejo o mar que prateava, e naquele instante foi só isso, isto e a espera de ver a toalhinha na janela do sexto andar avisando-me da hora de voltar para casa, pois provavelmente o almoço já estava para ser servido, lembro-me da amiga que morava no mesmo quarteirão e que trazia o violão para em baixo dos coqueiros tocarmos as horas e cantarmos nossos sonhos entre batidinhas nas pernas cruzadas dos surfistas amigos e os olhares atentos do posto de salva-vidas. Ah lembro também dos sabores da sorveteria Beija Frio, e do famoso carro do amigo, cujo apelido era Macarrão, sei que podem imaginar o motivo, era altíssimo e muito magro, mas o carro dele merece umas frases neste texto, pois sempre nos levava para dançar, assim como para os filmes do cinema Veneza ou São Luiz e depois acabava por nos abandonar na Sé de Olinda depois do lanche por não querer pegar! acho que aquele carro era apaixonado pela vista de Olinda! Sempre que chegávamos lá, ele decidia ficar, ainda bem que Olinda tem muitas ladeiras e depois de algumas tentativas e empurrões ele pegava no tranco descendo ladeira abaixo.
Numa outra pasta de memórias guardei o Brunel, ele e suas paredes de pedra, lindíssimo prédio que mais parecia um castelo, nesta pasta guardei especialmente a amiga Nathalie, Francesa de Toulouse, que nem recordo exatamente como conheci mas lembro que sempre estávamos juntas, mesmo quando nosso inglês ainda engatinhava e como nem eu falava Francês e nem ela Português, imagino hoje que realmente nossas afinidades apareceram antes da linguagem. Lá também guardo alguns professores inesquecíveis! a loirice feliz e terna de Sue Barnes, as graças do barbudo professor de fonética, e as diferentes e hilárias explicação da professora indiana de textos e contos. Guardo a biblioteca com seus silêncios e sussurros, o sabor do chá com leite, o clima dos pubs, e o rosto dos amigos que sempre se encontravam por lá. Lembro-me como ontem da casa de misses O'Brien, com tudo que ela representou para mim, guardo os dias de frio e de muito frio, o branco da neve, e o enganador céu azul que prometia calor mas mentia. Enfim hoje decidi lembrar e assim vou lembrando devagarzinho e abrindo pastas deste meu arquivo de tantas coisas, coisas que jamais serão apenas coisas, mas serão os pedacinhos de mim, e os que eu escolhi para guardar neste para sempre que nem sempre fica.


( Texto ainda em processo de criação, continuará)

Márcia Poesia de Sá - 2014.
Dias em que nos sentimos tão exaustas de sermos fortes
que tudo que queremos é a sombra de uma árvore
e em um sonho, nos imaginar criança outra vez. 

Márcia Poesia de Sá.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014


Areia de ampulheta

E o tempo esbarra nas demoras, 
caem pelo chão e rolam. 

Se melam de areia e saudade, 
enquanto a ausência cresce 
na memória de tantas presenças 

que liquefeitas escorrem 
pela face de quem ousou 
olhar nos olhos do invisível.

Márcia Poesia de Sá.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Fragmento (parte)

Já me perdi tantas vezes e me reencontrei, tomara que desta vez também eu consiga. Basta que não tenham mudado as curvas dos tantos caminhos que já segui, cegamente. Tateando espaços que desconhecia, palmo a palmo no rasante da alma, com o coração exposto na bandeja, ao sabor dos ventos, mesmo que sofrendo temporais. Tentando loucamente ver brisa onde só ha deserto. Já perdi tudo que tinha que perder nesta vida, nada mais me cabe inteira, sou fragmento. E ha momentos que vejo os meus tantos eus passarem por mim, em diversos tons tão repletos de tantas coisas que vejo caírem pelos caminhos, simplesmente perderem-se e perdendo-se, perco-me eu! é como se tivesse sofrido um esvaziamento natural. Fui silenciando densa e profundamente. Raspei o tacho, joguei os lixos e bato a porta mais uma vez. Trancando os cadeados que havia ignorado por esta estranha mania de crer em sonhos. Cá dentro, só um eu, outro eu a buscar-se infinitamente. Até quando vou aguentar? não sei...espanta-me esta coragem em despedaçar-me. Em entregar tudo que sofro tanto para reconstruir e ver ruir, e recomeçar e ver ruir numa incessante história que jamais finda. Hoje só o que sinto é a quente areia que escorre por entre meus dedos e pela ampulheta que ironicamente virei ao contrário!
Já me perdi de mim tantas vezes, que penso que nem seja mais eu, aqui.

Márcia Poesia de Sá - 2014
Contração 

Na 
garganta 
avoluma-se!
espessas paredes
(de pedra)

Dos olhos
(só areias...)

Na imensidão
de um silêncio
que hoje
brada incessante
e (inequívoco!)

Enquanto aguardas
ansioso
algo que
desconheço
conhecendo...

limitas tudo que vaga
impondo o solo!
de pés aos pares...

dilaceras asas
inflamas-me
(pesares)

Amargor
de rubros
paladares

vivo a morte
reviro-a
ao avesso
respiro o ar
úmido
da introspecção

numa cadência
nova

latente
contração.

Márcia Poesia de Sá.


O verdadeiramente bonito raramente 
está ao alcance dos olhos, 
mas reside quietinho, 
no lugar mais morno do coração. 

Márcia Poesia de Sá.

domingo, 9 de fevereiro de 2014


Adoro cavalgar nas asas do vento 
e sentir na pele ...

os anseios dos vendavais 
e os sopros e segredos das brisas...

Márcia Poesia de Sá



( Imagem gentilmente escolhida por meu amigo,  Luiz Coelho Rodrigues, mais um apaixonado por estes belíssimos animais...os cavalos!)
Visão interna

Ah...e esta sua incrível maciez que tentas tanto guardar, esconder, como se possível fosse, de mim, esconder o que quer que seja. E esta doçura toda que mais parece um abraço, que tentas fantasiar de educação. E este menino que ainda vive em ti, pulando escadarias e tocando campanhinhas pelos andares de tua vida, para mim, apenas olha maroto, e pisca o olho direito num sapeca sorrisinho que me diz que ele sim, te conhece. Ele sim, sabe de teus medos e das coisas que nem sempre queres lembrar e no entanto , rondam tuas atitudes muitas vezes tão longe da essência que te constrói por dentro. Nós temos isso sim, quem sou eu para julgar uma alma tão rica, ou seja lá quem for, tenho em mim uma humildade plena, e gosto de imaginar que todas as pessoas tem suas lições a aprender e que a nós só cabe aprender as nossas, e estar ali do lado daquelas que amamos para ajudar no que for possível, quem sabe um abraço na hora da dor, uma palavra amiga quando tudo parece vazio, um empurrãozinho quando a descrença quer abraça-las, e até chorar junto quando a perda é irremediável.
Mas também acredito nos sorrisos compartilhados, uma piada pode fazer raiar o sol no dia de alguém, acredito nos brindes nos sucessos e na incrível força que ha no afeto verdadeiro e desinteressado, acredito que a vida nos vai talhando veios, machucando calmamente nossos picos ilusórios, como se nos quisesse deixar mais suaves na paisagem, ela vai aniquilando tanta coisas em nós, apagando alguns brilhos que na nossa juventude mais parecem diamantes ao sol, e na nossa maturidade, apenas meros strasses...
Mas mesmo assim, esta minha alma repleta de sonhos e poesias ainda crê em coisas suaves e harmoniosas, em sentimentos verídicos e quentes, que podem sim, trazer a tona o doce perfume da época das inocências, podem sim, trazer-nos aos olhos as estrelas que julgávamos tão distantes de nós, quiçá impossíveis de serem novamente tocadas.
Ha de se ter humildade para se tocar de leve a face da felicidade. Os orgulhos, os medos de parecer ridículo, fraco, apaixonado ou bobo nos distancia tanto da nossa essência real. E você, especialmente você, com quem falo agora, pare e pense um pouco, tente imaginar o que de verdade o faria sentir plenitude de alma? o que seria capaz de amornar seu peito ao ponto de fazer você colocar a mão no coração tentando fazê-lo não pular para fora as cambalhotas!
Pense bem...Muito provavelmente em nada tem a ver com o que seu cotidiano o impulsiona a fazer mecanicamente dia após dia enquanto seus meses e anos escorrem pelas mãos...Precisamos de muito pouco de fora, e tanto de dentro, para que o nosso sorriso seja encantadoramente iluminado e visceralmente completo. É, eu venho buscando-me milimetricamente ha alguns anos, ah...já encontrei em mim tantas gavetas trancadas, tantos papiros amassados por de baixo de minhas estantes de certezas, e tantos "nunca mais!" que vi virarem pó em frente aos meus olhos, que hoje, acredito mais, é no silêncio da minha mente e nos cochichos baixinhos que diz meu coração, nos momentos em que paro e apenas observo meu sentir enquanto meus olhos passeiam pela natureza, pela arte ou por uma linda e irresistível folha de papel em branco.
Querido! nós somos uma folha de papel em branco! infelizmente os anos vão nos ludibriando, e ha momentos em que de fato, parece-nos que somos um livro finalizado, repleto de vícios e imutáveis como os antigos contos de capa dura...mas de verdade a capa dura é nossa responsabilidade! nós as criamos para proteger nossas frágeis folhinhas de simples papel. Papel que se amassa, se rabisca, se rasga pela vida e as vezes até incendeia, nos fazendo perder as esperanças de tudo.
Cabe só a nós, reacender o coração, iluminar os sonhos que ficaram jogados pelos cantos das ingratidões, das descrenças, dos desamores, das mentiras, e acesos eles, começam a clarear de novo tudo ao seu redor, a coragem de adoçar-se novamente deveria ser mais que uma meta, deveria ser um caminho e não tenha pressa, quão mais dolorida é nossa alma, maior ela se torna, portanto ha muitos cômodos a serem revisitados e docemente limpos, ha de se abrir as janelas de cada um deles, deixar que o sol remova toda a frieza que eles sempre guardam, ha de se trazer flores para dentro da alma e permitir que lentamente elas comecem a exalar seus perfumes...
Não tenha medo! afinal é só você...mas não o você que aparece no espelho pela manhã quando a pressa te empurra para a vida, mas o você que se permite em um dia de total folga e tempo, sentar-se na beira de um lago, olhar dentro de seus olhos, e dentro dos olhos no reflexo da água limpa, adentrar sua própria retina e descer calmamente por teu interior, com todo o carinho que só você pode se dar, veja sua criança agora, acuada pelos brandos dos anos, pegue-a pela mão, afague-a...tudo que ela precisa hoje pode dar a ela, ame-a como poucos souberam amar, diga-lhe que agora ela está segura e que nada poderá machuca-la porque hoje você pode de verdade cuidar dela, protegê-la e ama-la no mais profundo sentido que estas palavras carregam...
Depois disso, abra os olhos novamente e verá que seu mundo pode verdadeiramente ser como uma brisa numa praia bonita, que seu caminho pode sim, ser pegadas numa areia fofinha, e que o sol e a lua podem sim ser de encantamento puro! enfim, quem sabe neste dia você compreenda que o tempo perdido, nem foi perdido, foi só a escalada necessária para fazer de você o que é hoje, para fazer deste momento do reencontro com você algo mais que especial! e ai, possa de verdade ver, sentir e acreditar...que o amor existe! e que ele apesar de ter demorado muito para chegar, acaba de ancorar na sua vida e quem sabe, desta vez, tenha vindo para ficar.

Márcia Poesia de Sá - 2014

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Remoto e rasteiro

roí e ruminei
retroagi
retifiquei

rolaram rumores
rolaram resquícios
rolaram, rolaram...
corações aos abismos

ruas, ramagens, rouquidões
rolaram os roupões
caíram os lençóis
e as dobras de nós

ramificações infindas.

Listei linhas
labirintos e línguas
lastimei
o não lastimável
li e reli
o inelegível

ousei  crer



emoldurei o inefável
espargi solidamente
expressei o verniz
n'agua turva

Poli areia
polarizei
por tudo isto,
petrifiquei

E morrendo aos pouquinhos

encolhi o gigantesco
apaguei o perpétuo
queimei o úmido
jorrei

Agora?
nada.

Nada?!
só.


Márcia Poesia de Sá.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Na
Plant(ação)

da linha
Rumei
ao igarapé

Espargi 
s e (m e n t e s)
que caíram
na

Á
G
U
A

e...

fizeram

corre.........dei........ras

jamais as vi.

...MSÁ
In(verso)

De repente
numa superfície fria
a evaporação do avesso

Ao todo que habitava
Desconectando-se
Sai ileso.

Márcia Poesia de Sá.

Uma musica 

e
s
c
o
r
r
e
...

Escorre como água de chuva branda
Por sobre encostas de pedra.

Insurgindo em abismos
Que se deitam num mar

E que se erguem como mãos ao infinito!

Uma musica

é o lamento d’alma
Que chora suas ausências
Mesmo na infinitude de presenças várias

Uma musica

Tem a cadencia da saudade
Bem sentida
Internalizada
Digerida

Uma musica
Pode até ser carinho,

Quando o amor adormecido
Nem sequer sente
tua mão em seus cabelos

E o tão terno beijo
dado na face

Com um silente desejo:

De que lá no sonho, onde ele vaga

O perfume
do teu amor
o invada.

Márcia Poesia de Sá
Eu 
(só)
sinto!

e o ato de sentir
exaure-me

é demais!

Márcia Poesia de Sá